Prejuízos materiais

Bom dia, pessoal.

Depois de muitos meses e ainda sem perspectiva comercial, voltei à prática do artesanato. A ideia era repor meu estoque de produtos reciclados para compor presentes: latas de leite em pó, copos de requeijão, vidros de geleia etc. Eu gosto de ter esses produtos em casa para personalizar presentes e, para fazê-los, costumo usar as sobras de tinta, de papel de decupagem e de guardanapo.

Pois bem, ao selecionar os frascos de tinta mais vazios que tinha em casa para realizar esse trabalho, descobri que a tinta desses frascos havia secado, apesar de eles estarem bem fechados. Os longos meses de trabalho interrompido pelo isolamento social me trouxeram mais esse problema!

No meu caso, o prejuízo em termos financeiros nem foi tão grande assim, mas serviu como alerta. Reparei que o ressecamento de tinta ocorreu mais com frascos de tinta pva que tinham 10 a 20 por cento de conteúdo. Portanto, para diminuir minhas perdas, vou fazer um levantamento de todas as tintas que estejam nessas condições e vou utilizá-las imediatamente. Depois eu vejo os papeis que melhor combinem com a tinta utilizada, o que é uma inversão do processo normal.

Essa experiência me fez pensar no volume cada vez maior dos prejuízos gerados pela pandemia e em como essas perdas serão inevitavelmente repassadas para os custos finais dos produtos, não apenas no artesanato, mas em toda a cadeia da economia. Infelizmente, como o isolamento social continua a ser a forma mais eficiente de tentar diminuir a taxa de transmissão do vírus, só me resta desejar que a vacina chegue até nós o mais rápido possível e, claro, que funcione e nos permita, ao menos voltar, com as medidas de segurança que estarão aí por muito tempo ainda, a nossa atividades.

Sei que muitas pessoas não acreditam ou não podem fazer esse isolamento. Entretanto, eu preciso agir conforme a minha cabeça e, no momento, isso significa manter o isolamento. Por essa razão, lá atrás, eu parei com o artesanato. É irônico pensar que, pela mesma razão, acrescida da perda de material, eu vou voltar a ele.

Então, mãos à obra. Tenham todos uma ótima semana!

Odisseia – Parte 5

Bom dia pessoal!

Vou continuar hoje com minha leitura do livro Odisseia, de Homero. Se você não leu as quatro primeiras partes deste estudo, é interessante ler a parte1, a parte2 , a parte 3 e a parte4 antes de continuar a ler esta postagem.

Então, vamos lá. Apesar de a viagem de regresso de Ulisses ter durado dez anos, ele não esteve navegando por todo esse tempo. Nos últimos sete anos desse período, Ulisses ficou retido, sozinho e sem barcos, na ilha da ninfa Calipso. Ele estava retido, mas estava longe de estar preso ou sendo torturado. Na verdade, Calipso havia se apaixonado e Ulisses desfrutava de sua companhia e de sua cama. Portanto, pelos conceitos de hoje, não se pode dizer que Ulisses tenha sofrido tanto quanto Penélope e, mais uma vez, não haverá culpa por parte do humano, mas tão somente o capricho dos deuses justificando suas ações.

Tendo decido, em concílio que não contou com a participação de Poseidon, que já era hora de se permitir que Ulisses regressasse a Ítaca, os deuses ordenam a Calipso que liberte o grego, dando-lhe uma jangada para que possa alcançar Esquéria, onde poderia conseguir barco e homens para levá-lo para casa.

Poseidon, o deus responsável pelos obstáculos marítimos encontrados por Ulisses (saberemos o porquê na próxima postagem), continua a tentar vingar-se e, através de uma tempestade, fará com que o grego seja atirado da jangada ao mar mas, com muita dificuldade, ele consegue nadar até a terra dos Féaces (Esquéria).

É no palácio do rei Alcino que, através de um aedo, um contador de histórias, tomamos conhecimento dos momentos finais da guerra de Troia.

Assim falou; e o aedo, inspirado por um deus, começou a entoar seu canto, desde o momento em que os Argivos, após terem incendiado as tendas, se afastavam em suas naus de sólidos bancos; enquanto outros, encerrados no cavalo, ao lado do muito famoso Ulisses, já estavam na ágora dos Troianos, porque estes mesmos o tinham arrastado para a acrópole. Ali se encontrava o cavalo, de pé, e os Troianos, sentados em derredor, discorriam ao acaso, sem tomarem nenhuma resolução. Três eram as propostas preferidas: ou trespassar com o inexorável bronze o bojo de madeira; ou arrastá-lo para o cimo dos rochedos e precipitá-lo desde aí; ou acatá-lo como oferenda propiciatória aos deuses. Esta última devia prevalecer, porque era fatal a ruína, desde que a cidade encerrava dentro das muralhas o enorme cavalo de madeira, onde se ocultavam todos os mais valentes dos Argivos, para levarem aos Troianos a carnificina e a morte.

Ulisses revela, então, sua identidade e passa finalmente a narrar (já estamos na rapsódia IX) a história de seu regresso desde Troia. Neste regresso, destaco os seguintes episódios: a terra dos Lotófagos, a ilha dos Ciclopes, a ilha de Circe, a visita ao Hades, a região da sereias, Cila e Caribdes, a ilha de Hélio e a ilha Ogígia (Calipso). Essa lista não esgota as aventuras de Ulisses até ali, mas são pontos que marcam momentos decisivos para se entender como a viagem de retorno começa em Troia com Ulisses no comando de uma frota de 12 navios e termina em Ítaca, onde Ulisses chegará sozinho, irreconhecível, sem camaradas ou navios.

Entretanto, esses destaques ficam para uma próxima postagem. Tenham todos uma ótima semana!

Consumo consciente?

Bom dia, pessoal.

Há alguns dias, li uma matéria que mostrava pessoas que aceitaram o desafio auto imposto de ficar algum tempo (tipicamente, um ano) sem consumir certo tipo de mercadoria. Cada pessoa pode decidir o que tentará diminuir ou controlar, mas a grande maioria decide consumir apenas produtos de primeira necessidade.

Imediatamente, pensei que já faz quase um ano que eu estou fazendo exatamente isso! Por conta do isolamento social, meu consumo caiu drasticamente e, hoje, está limitado a itens de alimentação, remédios, material de limpeza, material de higiene e livros (que, para mim, é um artigo de primeira necessidade!). Isso foi uma necessidade imposta pela pandemia, mas vejo agora que não foi algo que me deixou triste ou deprimida, muito pelo contrário.

Claro que todos sabemos que a economia precisa do consumo para crescer e manter-se “saudável”. Isso é mais que um ciclo vicioso, é uma espiral viciosa. O planeta não aguenta essa necessidade perpétua de crescimento e o consequente aumento de resíduos não tratados. Soluções terão que ser encontradas e acho que foi bom, mesmo que por razões desagradáveis, eu ter dado essa parada e ter percebido que meu padrão de consumo estava ajudando a manter essa espiral. Foi muito bom saber que eu consigo mudar a forma com que lido com o consumo e passar a dar mais valor ao que realmente preciso. Isso é um novo hábito e ensinamento que eu quero manter no futuro. Sei que essa percepção não é geral, nem mesmo majoritária, mas, se um número razoável de pessoas tiver passado por essa mesma experiência, talvez comecemos a dar um alívio ao planeta.

Não é razoável pensar que diminuir o consumo irá gerar desemprego. Isso é uma falácia usada de forma deliberada. Usando a mesma linha de raciocínio, posso dizer que se eu compro com mais critério, sobrará mais dinheiro no fim do mês, que poderá ser usado em serviços, viagens etc., e isso pode gerar mais empregos. A economia sempre se adapta às situações e, no caso de alterarmos nossa forma de consumo, não será diferente e o planeta poderá agradecer. Então, não foi minha intenção aceitar o desafio de ter um consumo mais consciente, foi uma experiência provocada por uma crise. Entretanto, foi uma lição cujos resultados podem ser, agora, utilizados de forma bastante consciente.

Uma ótima semana a todos!

Telemaquia (2)

Bom dia pessoal!

Vou continuar hoje com minha leitura do livro Odisseia, de Homero. Se você não leu as três primeiras partes deste estudo, é interessante ler a parte1, a parte2 e a parte 3 antes de continuar a ler esta postagem.

A Ilíada é o poema épico de Homero cuja temática é a guerra de Troia. Entretanto, o livro não faz um um relato sobre essa guerra, mas concentra-se apenas em um curto período, sem que saibamos como o conflito termina ou quem sobreviveu a ele ou como foi o retorno dos guerreiros para seus lares. É na Odisseia que todas essas questões são respondidas, seja pelas perguntas de Telêmaco seja pela fala do próprio Ulisses.

A Telemaquia, primeira parte de Odisseia, mostra Telêmaco saindo de Ìtaca em busca de notícias sobre o pai, que ainda não regressou de Troia. Sua viagem o levará primeiro a Nestor e depois a Menelau. Ambos lutaram ao lado de Ulisses e Telêmaco tinha esperança em que conhecessem seu destino.

Em Pilo, Telêmaco consulta Nestor, que fala sobre o retorno dos gregos em diversas frotas que seguiram caminhos diferentes. Telêmaco é informado sobre o destino de Agamenon e a posterior vingança de Orestes por seu assassinato. Entretanto, Nestor não sabe dizer o que aconteceu com Ulisses e aconselha Telêmaco a procurar Menelau, já que este finalmente conseguiu retornar à Lacedemônia após sete anos de viagem (uma odisseia quase tão longa como a do próprio Ulisses).

Vai agora com tua nau e teus companheiros. Se quiseres viajar por terra, ponho à tua disposição carro e cavalos, e também meus filhos, que te acompanharão até a divina Lacedemônia, onde mora o louro Menelau. Roga-lhe que te diga toda a verdade. Não receie que te minta, pois é homem de grande lealdade.

Ao se encontrar diante de estrangeiros e ainda sem saber quem são, Menelau já indica não conhecer o destino de Ulisses.

Contudo, em meio a tanta amargura, por nenhum de meus companheiros tantas lágrimas derramo, como por um, a saudade do qual me perturba o sono e a comida: porque ninguém entre os Aqueus, passou por tantas provações quantas Ulisses sofreu e suportou. Assim quis o destino: para ele as tribulações, para mim uma eterna saudade. Ei-lo ausente há tanto tempo, e nós sem saber se está vivo ou morto. Sem dúvida que também o choram o velho Laertes e a fiel Penélope e Telêmaco, que ele teve de deixar em casa, apenas recém-nascido.

É neste ponto que nos encontramos de novo com Helena, esposa de Menelau, cujo “rapto” e posterior resgate teriam sido a causa de guerra de Troia. Cabe aqui lembrar que os deuses do Olimpo grego são imortais, porém são movidos por paixões e tomam partido nas disputas dos mortais, inclusive em suas guerras. Desta forma, teria sido uma deusa a responsável por Helena ter se envolvido com Páris e ter fugido com ele para Troia. Após um tempo, porém, Helena teria voltado ao normal e arrependido-se de sua conduta. Ao ser resgata, portanto, ela volta ao convívio do marido e, nesta quarta rapsódia, ouvimos, então, sua voz.

Ansiava por voltar para casa, e lamentava a cegueira com que Afrodite me ferira ao conduzir-me para lá, longe da pátria, deixando atrás de mim a filha, o tálamo e o esposo, que a ninguém é inferior em espírito e beleza.

Menelau passa a contar o que sabe, informado que foi por um deus, claro, a respeito dos outros guerreiros gregos. Assim, Telêmaco fica sabendo que o pai está vivo, mas se encontra na ilha da deusa Calipso, de onde não tem meios de sair.

Em Ítaca, apenas nesse momento, Penélope descobre a viagem do filho e s intensão dos pretendentes de matá-lo quando de seu retorno. Os temores de Penélope são acalmados por Atenas após aquela lhe ter dirigido suas preces.

Temos até aqui uma introdução para mostrar como estavam as coisas em Ítaca em quanto Ulisses vivia uma odisseia para retornar a sua casa e a sua família. A partir da rapsódia V, passamos a conhecer os fatos e aventuras que formam essa odisseia, assim como novos vislumbres da guerra de Troia, mas isso é papo para outra postagem.

Tenham todos uma ótima semana;

Seja Bem-vindo 2021!

Bom dia, pessoal.

Começamos um novo ano, mas será que este será um ano novo? Será ele diferente de 2020? Se for, essa diferença será para melhor ou para pior? Particularmente, começo este ano com grandes sonhos, mas sem grandes planos. Para planejar, é preciso ter uma ideia de onde se está e aonde se quer ir, e o fato é que este cenário está longe de ser claro.

Mesmo que a vacina chegue e seja eficaz, não acredito em um primeiro semestre diferente de 2020, até porque, para aplicar vacinas, você precisa ter seringas e agulhas suficientes. Por isso, meus planos para este ano ainda levarão em conta as medidas sanitárias adotadas até agora: distanciamento, máscara, álcool gel, ventilação natural etc. Diferente de planejar, sonhar não tem limites, então, vale sonhar com um ano que marque o fim da pandemia e a constatação que temos uma sociedade mais empática.

Várias de minhas atividades vão ficar no meio do caminho entre planejar e sonhar. Sonho com a volta do artesanato, mas planejo começar o ano com reciclagens simples, para uso próprio. Sonho em voltar a estudar, mas planejo selecionar algum curso de ensino à distância. Sonho com um projeto de jardinagem, mas planejo começar com o material que já tenho em casa. Então, sonho grande, mas planejo com, ao menos, um pé no chão.

O convívio com os amigos, as atividades externas, as viagens e outras coisas que tanto fizeram falta em 2020 começam o ano no campo dos sonhos, mas prontas e ansiosas para virarem realidade. O ano de 2021 começa com seu mês mais complicado. Janeiro mostrará os excessos cometidos nas festas de fim de ano. Mostrará se o ser humano aprendeu as lições do último ano e se poderemos, enfim, começar a agir como uma equipe onde todos remam no mesmo sentido.

Os fogos foram menos intensos, é verdade, mas as inúmeras aglomerações só mostrarão seus efeitos no meio do mês. Claro que é perfeitamente compreensível que as pessoas desejem fazer festas e comemorar o término de um ano tão complicado. O que não dá para entender muito bem é que as pessoas não entendam que essas festas provocarão a continuação do ano passado ao invés de marcar seu fim.

Então, 2021 será um ano para colher resultados do que foi plantado em 2020 e que esta colheita seja a melhor possível para cada um de nós. Um excelente 2021 para todos!!

Natal 2020

Bom dia, pessoal!

O Natal tem um sentido religioso para alguns, tem um sentido festivo para outros e não tem sentido algum para muitos. Esta é uma data que pode assumir os mais diversos significados, inclusive o significado astronômico de solstício de inverno no hemisfério norte.

Tem quem valorize essa época apenas pelo aspecto comercial. Os presentes sempre foram um apelo importante, principalmente para as crianças até a minha geração. Durante o ano, o aniversário e o Natal eram as únicas expectativas que tínhamos de ganhar presentes e, para garantir um bom presente de Natal, valia até estudar mais para não ficar em recuperação no fim de ano!

Tem ainda quem veja essa época, com apreensão ou expectativa, como a oportunidade de reunir a família em uma confraternização ao redor de uma mesa. Tem quem se divirta decorando a casa, planejando a ceia, preparando o amigo-oculto etc. e, claro, tem quem ache isso um pesadelo.

A preparação para o Natal também mostra diferentes características pessoais. Há os que começam a planejar o Natal com meses de antecedência e há os que se surpreendem ao perceber que o Natal já chegou e ainda há tanto o que fazer. Há os que viajam para fugir da movimentação desta data e há os que só querem envolver-se com o aspecto religioso do Natal.

Enfim, há todo o tipo de pessoas e todo o tipo de situação, mas, para todos, o ano de 2020 impôs o grande desafio de fazer as coisas de sempre de maneira diferente. Todos (com exceção dos que não acham que há uma razão para se preocupar) tiveram que se adequar às restrições impostas pela pandemia. Este Natal, mais que uma celebração, foi um exercício de criatividade.

Agora, chegam as festas de fim de ano e as retrospectivas de 2020. O ano foi difícil, perdemos amigos, conhecidos, familiares, pessoas famosas e pessoas anônimas. Todas as coisas ruins do ano serão lembradas nas retrospectivas exibidas na TV. Entretanto, não nos esqueçamos de agradecer também por tudo que houver acontecido de bom conosco. A gratidão é saudável e faz muito bem à alma.

Tenham todos uma ótima semana!

Telemaquia (1)

Bom dia pessoal!

Vou continuar hoje com minha leitura do livro Odisseia, de Homero. Se você não leu as duas primeiras partes deste estudo, é interessante ler a parte1 e a parte2 antes de continuar a ler esta postagem.

A Telemaquia é formada pelas quatro primeiras rapsódias do poema de Homero. A figura central deste trecho da obra é Telêmaco, o filho recém nascido que Ulisses deixou em Ítaca ao partir para Troia. Neste ponto da história, Telêmaco tem vinte anos, mas não tem nenhuma autoridade sobre Ítaca ou sequer sobre seu próprio palácio, onde mora com sua mãe, Penélope.

Telêmaco está na fase de transição entre o adolescente e o adulto, vivendo seus momentos de insegurança. Ele não consegue impor sua vontade e expulsar os diversos pretendentes a futuro marido de Penélope do palácio de Ulisses, e vê a fortuna deste ser esbanjada em banquetes diários exigidos por esses pretendentes. Telêmaco apela pela ajuda dos deuses gregos, que se envolviam a todo momento nos eventos dos mortais. Como tanto Ulisses como Telêmaco eram favorecidos pela deusa Atenas, é ela que tem participação decisiva na obra.

Os pretendentes eram nobres locais que, acreditando que Ulisses havia morrido na viagem, queriam que Penélope escolhesse, entre eles, um novo marido, que reinaria sobre Ítaca. Até que a escolha fosse feita, eles se achavam no direito de ocupar o palácio e banquetear-se às custas de Ulisses. É Atenas que, disfarçada como um mortal, vai à Ítaca convencer Telêmaco que já é tempo de ele agir e partir em viagem para descobrir o destino do pai.

Em primeiro lugar, dirige-te a Pilo e interroga o venerável Nestor; dali, segue para Esparta, ao palácio do louro Menelau: é ele o último dos Aqueus de éneas couraças que regressou.

Temos aqui, portanto, um rapaz inexperiente de vinte anos que, não sendo um guerreiro, não é respeitado pelas pessoas, Por sua vez, Penélope sendo mulher, também não tem, naquela cultura, autoridade sobre sua casa. Neste contexto, a proposta fortemente incentivada de Atenas funcionará como um rito de passagem para que Telêmaco seja considerado um homem e consiga a autoridade que lhe falta para conseguir expulsar os pretendentes. É interessante observar que, apesar de toda sua insegurança, Telêmaco é o produto de uma sociedade patriarcal e assume que todos os bens materiais são seus por direito. Ao se lamentar com Atenas, novamente disfarçada como mortal, a respeito de seus problemas, Telêmaco diz que:

“[…] Todos eles cortejam minha mãe e devoram meus bens familiares. Ela, sem recusar abertamente um matrimônio que lhe repugna, não se sente com forças para pôr fim a tal situação. Entretanto, eles consomem e devoram meus bens e dia virá em que também se desfarão de mim”.

O restante desta rapsódia mostra como Telêmaco tenta, entre o povo de Ítaca e sem sucesso, conseguir apoio logístico para sua viagem. Mais uma vez, será Atenas que virá em seu auxílio e viabilizará a viagem. Com o plano em andamento, Telêmaco já dá mostra de uma maior ousadia ao se dirigir a Antino, um dos pretendentes:

[…]”Antino, não me é possível, sem protesto, banquetear-me em vossa petulante companhia, nem divertir-me, de coração leviano. Não será bastante que vós, pretendentes, tenhais consumido até este dia tantos bens preciosos, meu patrimônio, enquanto eu era criança? Mas agora que cresci, que me instruo com o que os outros me dizem, agora que sinto aumentar em mim a bravura, tratarei de lançar contra vós as funestas Queres, quer vá a Pilo, quer permaneça aqui entre o povo.”

Observamos nesta rapsódia uma espécie de rito de passagem entre a criança indefesa que era Telêmaco em direção ao jovem que sai de casa em uma aventura, na esperança de tomar o controle sobre sua vida. Telêmaco é um personagem fictício, mas não tão diferente assim de tantos adolescentes vistos tanto na época de Homero como nos dias de hoje.

Vou ficando por aqui e desejando a todos uma ótima semana!

2020 e a Idade Média

Bom dia, pessoal!

O ano de 2020 vai ficar marcado na memória de muitas pessoas como ficou marcada a Idade Média na história. Quando pensamos em Idade Média, associamos este período a pragas, pestes, obscurantismo, cidades insalubres e cheias de ratos. Pouca gente considera que coisas boas aconteceram, que pessoas viveram felizes, que descobertas foram feitas. A Idade Média passou à história como a Idade das Trevas e assim é vista até hoje.

O ano de 2020 passará à história como o ano perdido, como se nada de bom houvesse acontecido. Talvez, por isso, torna-se ainda mais importante que cada um faça uma lista das coisas boas que aconteceram este ano. Para muitas pessoas, este ano foi marcado por nascimentos, casamentos, reencontros, superação, desafios vencidos, consciência desenvolvida e outras coisas boas. Não se trata de negar as coisas ruins. Elas estão aí, muito claras e marcantes, e não vão desaparecer magicamente na passagem de ano. Entretanto, trata-se de valorizar as coisas boas e ser gratos por elas e pela força que elas transmitem.

Um balanço equilibrado é importante para que vejamos que o ano foi muito difícil, sim, mas que, como nunca, permitiu oportunidades de reflexão e crescimento para muitos. Se essas oportunidades foram ou não aproveitadas é algo que dependeu de cada um, e não do ano. Pessoalmente, não gostaria que este ano se repetisse. Torço para que, em 2021, a pandemia seja controlada e eu possa voltar a encontrar os amigos (ainda que com novos cuidados), viajar, voltar a me dedicar ao artesanato etc. Entretanto, não quero que as lições aprendidas em 2020 sejam esquecidas.

A história nos ensina que a compreensão do passado é importante para evitar os erros cometidos. Assim como o estudo da Idade Média nos faz refletir sobre os perigos da ignorância e da intolerância, a reflexão que devemos fazer neste fim de ano deve envolver o comportamento da sociedade frente à crise sanitária, a falta de empatia e sobre o que podemos fazer para que o próximo ano seja realmente novo. A questão é, apenas, se estamos dispostos a fazer tais reflexões e a operar em nós as mudanças necessárias.

De qualquer forma, o importante na passagem de ano é não fazer de 2020 a nova Idade Média da humanidade, associando a este ano apenas as coisas ruins.

Tenham todos uma ótima semana!

Odisseia – Parte 2

Bom dia pessoal!

Vou dar hoje mais um passo na análise do livro Odisseia, de Homero. Se você não leu a primeira parte deste estudo, é interessante ler a parte1 antes de continuar a ler esta postagem.

Na maior parte do tempo, nós não temos uma consciência histórica, ou seja, não conseguimos nos por no tempo do fato analisado. A mesma coisa acontece com a análise literária. Sabemos que, originalmente, a Odisseia, de Homero, é um poema, mas não pensamos, por exemplo, na razão de ele ser um poema.

Não faz muito tempo que ler e escrever eram conhecimentos restritos a uma minúscula parte da população, assim como não faz tanto tempo que os texto escritos não eram impressos, mas registrados manualmente nos mais diversos materiais: papiros, pele de animais, pedra etc. A noção de livro certamente não era conhecida ou sequer imaginada por Homero (que, na verdade, sequer sabemos se realmente existiu).

Uma história como a Odisseia não era perpetuada através da escrita, mas através da oralidade. As histórias eram memorizadas para serem cantadas. Sim, a Odisseia chegou até nós porque sucessivas gerações memorizaram cada uma de suas linhas e a forma mais fácil de memorizar um texto é na forma de poema, que pode ser cantado. Essa era a função do aedo, que na Grécia antiga recitava os poemas ao som da lira.

Outra coisa que eu queria comentar sobre este livro é que se trata de um poema épico criado há vários séculos (talvez no século VIII a.C.), mas cuja estrutura é utilizada ainda hoje. Muitos dizem que a Odisseia parece ser um poema moderno, mas é justamente o contrário. Após a Idade Média, a Europa viveu o chamado Renascentismo e uma das característica desse movimento foi o classicismo, a idealização de valores e formas existentes no mundo clássico que, à época, era representado pela Grécia de Sócrates e Homero. Não é nenhuma coincidência o fato de Os Lusíadas, poema renascentista escrito por Camões, ter exatamente a mesma estrutura de Odisseia. Portanto, não é o poema de Homero que parece moderno, mas os poemas épicos modernos é que foram beber da fonte grega.

A Odisseia é, assim, um poema dividido em rapsódias (cantos) e começa no meio da história, fazendo a seguir um flashback para que este ponto seja alcançado e avançando até o final da história. Esse estilo tem o nome de in media res e é mais uma construção não coincidentemente utilizada em Os Lusíadas.

O ponto em que começa a Odisseia é chamado de Telemaquia (rapsódias I a IV) , mostra o que está acontecendo em Ítaca e tem Telêmaco (o filho recém nascido deixado por Ulisses quando de sua ida à Tróia e que, neste momento, já tem 20 anos) como figura central. Então, a Telemaquia será o tema de uma próxima postagem.

Tenham todos uma ótima semana!

Movimento Slow

Bom dia, pessoal.

Movimento slow, como definido no wikipedia, “é um movimento que propõe uma mudança cultural para a desaceleração da vida cotidiana”. Ele começou como uma contraposição ao fastfood, no sentido de que fazer (ou comer) muito rapidamente não significa eficiência, podendo significar apenas que estamos prejudicando nossa saúde física e mental. Com o tempo, essa noção foi estendida a várias outras áreas e atividades.

Muitas vezes, já me vi na situação de estar fazendo duas ou três coisas ao mesmo tempo e isso é incentivado no mercado de trabalho, principalmente na área técnica, sendo, muitas vezes, considerado um diferencial positivo e, portanto, valorizado. Entretanto, o movimento slow vai dizer que, se você está fazendo três coisas ao mesmo tempo, provavelmente não está realmente presente em nenhuma delas, não está atento a nenhuma delas.

Slow, apesar de significar devagar em português, não tem a conotação de vagaroso, mas de atenção, de presença consciente. Nesse sentido, o artesanato, por exemplo, é uma atividade que se enquadra na categoria slow, já que ele não funciona como uma linha de produção. Pelo contrário, a confecção de cada peça é um processo único, que demanda toda a atenção do artesão.

Meu envolvimento inicial com o artesanato foi justamente uma tentativa de administrar o estresse, pois eu já sentia que estava levando uma vida muito acelerada. Admito, porém, que a aposentadoria e o presente isolamento social causado pela pandemia da COVID-19, têm sido uma experiência que me permitiu prestar mais atenção a este movimento e a ver como toda aquela aceleração me fazia mal.

Apesar de parecer bem convidativo, para quem vive em uma cidade grande, o movimento slow pode parecer irrealizável. Estamos acostumados a um ritmo frenético, a ficar horas nos engarrafamentos de ida e volta ao trabalho, da escola etc. Na correria característica dos grandes centros urbanos, podemos até dizer que não temos tempo para agir com consciência, que muitas coisas precisam acontecer no automático.

Entretanto, mesmo no mercado de trabalho, as pessoas podem ter atitudes que ajudem a desacelerar. Cultivar uma planta, ouvir música no engarrafamento, pintar, optar por programas mais calmos no fim de semana etc. Cada pessoa conhece a si mesma e pode pensar em coisas que gostaria de fazer e fazê-las com plena atenção e, de preferência, com o celular desligado. Os resultados podem realmente ser surpreendentes.

Tenham todos uma ótima semana!