Joseph Campbell, um estudioso de mitologia já falecido, costumava dizer que a sociedade moderna muda tão rápido que não dá tempo de desenvolver uma mitologia.
Realmente, o ser humano sempre criou mitos para entender seu papel no universo, na sociedade e em sua própria vida. Entretanto, o desenvolvimento de um mito precisa de contemplação, de símbolos que sejam reconhecidos e internalizados por quem os vive. E tudo isso precisa de rituais, que não existem mais em uma sociedade tão acelerada, que todos vivem “no automático”.
Houve uma época em que os eventos eram determinados por ciclos naturais. Navegações dependiam dos ciclos de ventos e correntes, o trabalho no campo dependia do ciclo das chuvas, a vida doméstica obedecia ao ciclo do sol. Resumindo, a natureza ditava o ritmo da vida, o que se refletia nos mitos desenvolvidos pela humanidade.
Aí veio a Revolução Industrial e tudo começou a mudar. Ventos e correntes foram substituídos pelos motores, as chuvas pela irrigação e o sol pela luz elétrica. De certa forma, nós descartamos os ciclos da natureza e os substituímos por equipamentos e técnicas que eram mais “eficientes”, mas que não produziram uma mitologia.
O problema disso é que o ser humano perdeu a base simbólica que lhe dava a segurança de saber seu papel na sociedade, já que, em paralelo, os mitos e seus rituais passaram a ser associados ao atraso. Mandela, por exemplo, dizia que a cerimônia de passagem da infância para a fase adulta foi muito importante para ele. Em um único momento, a criança que ele era deixou de existir e ele passou a se ver como um adulto com responsabilidades sociais. Sem esse tipo de mitologia e seus rituais, o ser humano fica perdido. Muitas pessoas hoje avançam na idade, mas não percebem que deixaram de ser crianças e consideram que precisam continuar a ser cuidados por todos; sem deveres sociais.
A natureza não determina mais o nosso ritmo, mas não ficamos independentes, já que esse ritmo passou a ser determinado por alguma outra coisa: relógio, cartão de ponto etc. Rituais são considerados marca do atraso, mas sua falta criou uma série de neuroses.
Campbell morreu em 1987, e já naquela época, ele observava que a falta de uma mitologia que ajudasse o ser humano a se localizar no tempo, no espaço e na vida gerava desequilíbrios importantes, Mal sabia ele que a vida aceleraria muito mais e que ainda havia muito espaço para pioras.
Tenham todos uma ótima semana.