Bom dia pessoal!
Vou continuar hoje com minha leitura do livro Odisseia, de Homero. Se você não leu as duas primeiras partes deste estudo, é interessante ler a parte1 e a parte2 antes de continuar a ler esta postagem.
A Telemaquia é formada pelas quatro primeiras rapsódias do poema de Homero. A figura central deste trecho da obra é Telêmaco, o filho recém nascido que Ulisses deixou em Ítaca ao partir para Troia. Neste ponto da história, Telêmaco tem vinte anos, mas não tem nenhuma autoridade sobre Ítaca ou sequer sobre seu próprio palácio, onde mora com sua mãe, Penélope.
Telêmaco está na fase de transição entre o adolescente e o adulto, vivendo seus momentos de insegurança. Ele não consegue impor sua vontade e expulsar os diversos pretendentes a futuro marido de Penélope do palácio de Ulisses, e vê a fortuna deste ser esbanjada em banquetes diários exigidos por esses pretendentes. Telêmaco apela pela ajuda dos deuses gregos, que se envolviam a todo momento nos eventos dos mortais. Como tanto Ulisses como Telêmaco eram favorecidos pela deusa Atenas, é ela que tem participação decisiva na obra.
Os pretendentes eram nobres locais que, acreditando que Ulisses havia morrido na viagem, queriam que Penélope escolhesse, entre eles, um novo marido, que reinaria sobre Ítaca. Até que a escolha fosse feita, eles se achavam no direito de ocupar o palácio e banquetear-se às custas de Ulisses. É Atenas que, disfarçada como um mortal, vai à Ítaca convencer Telêmaco que já é tempo de ele agir e partir em viagem para descobrir o destino do pai.
“Em primeiro lugar, dirige-te a Pilo e interroga o venerável Nestor; dali, segue para Esparta, ao palácio do louro Menelau: é ele o último dos Aqueus de éneas couraças que regressou.“
Temos aqui, portanto, um rapaz inexperiente de vinte anos que, não sendo um guerreiro, não é respeitado pelas pessoas, Por sua vez, Penélope sendo mulher, também não tem, naquela cultura, autoridade sobre sua casa. Neste contexto, a proposta fortemente incentivada de Atenas funcionará como um rito de passagem para que Telêmaco seja considerado um homem e consiga a autoridade que lhe falta para conseguir expulsar os pretendentes. É interessante observar que, apesar de toda sua insegurança, Telêmaco é o produto de uma sociedade patriarcal e assume que todos os bens materiais são seus por direito. Ao se lamentar com Atenas, novamente disfarçada como mortal, a respeito de seus problemas, Telêmaco diz que:
“[…] Todos eles cortejam minha mãe e devoram meus bens familiares. Ela, sem recusar abertamente um matrimônio que lhe repugna, não se sente com forças para pôr fim a tal situação. Entretanto, eles consomem e devoram meus bens e dia virá em que também se desfarão de mim”.
O restante desta rapsódia mostra como Telêmaco tenta, entre o povo de Ítaca e sem sucesso, conseguir apoio logístico para sua viagem. Mais uma vez, será Atenas que virá em seu auxílio e viabilizará a viagem. Com o plano em andamento, Telêmaco já dá mostra de uma maior ousadia ao se dirigir a Antino, um dos pretendentes:
[…]”Antino, não me é possível, sem protesto, banquetear-me em vossa petulante companhia, nem divertir-me, de coração leviano. Não será bastante que vós, pretendentes, tenhais consumido até este dia tantos bens preciosos, meu patrimônio, enquanto eu era criança? Mas agora que cresci, que me instruo com o que os outros me dizem, agora que sinto aumentar em mim a bravura, tratarei de lançar contra vós as funestas Queres, quer vá a Pilo, quer permaneça aqui entre o povo.”
Observamos nesta rapsódia uma espécie de rito de passagem entre a criança indefesa que era Telêmaco em direção ao jovem que sai de casa em uma aventura, na esperança de tomar o controle sobre sua vida. Telêmaco é um personagem fictício, mas não tão diferente assim de tantos adolescentes vistos tanto na época de Homero como nos dias de hoje.
Vou ficando por aqui e desejando a todos uma ótima semana!